domingo, 1 de maio de 2016

É JUSTO? (2)

ZILDO GALLO

Garimpar imagens na internet e compará-las pode ser um bom exercício para compreender o mundo nos dias de hoje. Muitas vezes as imagens falam por si mesmas, como nas fotografias de Sebastião Salgado, mas elas podem (servem) para ilustrar crônicas e poemas como é o caso do meu poema "O Conhecimento Espelhado". As imagens podem ajudar na compreensão de textos, podem? Elas podem falar mais que os textos. Às imagens e ao poema!


SOMOS TODOS IGUAIS?


TEMOS OS MESMOS DIREITOS?


O CONHECIMENTO ESPELHADO

Porque somos todos iguais,
Não podemos aceitar a exclusão
Pela diferença
E não podemos ser
Indiferentes.
A indiferença afasta
E desiguala.

Porque, para sermos humanos
De verdade,
Devemos de verdade aprender
A viver em sociedade,
Onde nos tornamos
Verdadeiramente humanos
E, para sermos humanos verdadeiros,
Só o que é justo a todos
Deve ser
Verdadeiramente aceitável.

Não é justo
Que uns possam acessar saberes
Mais facilmente e melhor
Que outros,
Achando que o outro
É só o outro
E que eles são mais eles.

Eu sou eu (humano)
Porque o outro é outro
Tão humano como eu,
Como num espelho plano e polido
A me refletir.

O espelho perfeito me espelha
Apenas de forma invertida,
Mas as proporções do outro lado
São as mesmas,
Idênticas,
Reais.

Quando o espelho se deforma
O outro que vejo à frente
Deformado me parece.
Acessos diferenciados aos saberes
Deformam e embaçam
O espelhos colocados à frente
De cada um.

UM POUCO DE CONVERSA E MAIS DOIS POEMAS

Em 1975, lá se vão mais de 40 anos, eu escrevi dois poemas que têm a ver com o que está exposto acima. Naquela época eu ainda não tinha a compreensão da abrangência de ambos. Em "Jogo de Espelhos", consegui alcançar a compreensão de que somos reflexos de tudo que está à nossa volta, que somos imagens distorcidas em espelhos imperfeitos e que isto nos assusta. Em "Vida-Medo", compreendi que o medo distorce a nossa visão da realidade e o centro do medo é algo muito primitivo e está ligado à sobrevivência material, que em tempos longínquos era muito mais difícil que hoje, trata-se do medo ancestral da escassez.

O medo da escassez nos coloca no mundo de forma egoísta e nos afasta da nossa verdadeira essência que é altruísta e compassiva. O afastamento é tamanho que chegamos a achar natural a diferença brutal entre as duas salas de aula das imagens expostas aqui. Na verdade, chegamos a desejar que só os nossos filhos tenham acesso à melhor sala e que os filhos dos outros fiquem na pior, pois isto colocará os primeiros em vantagem em relação aos segundos, neste nosso mundo competitivo que construímos por conta do desnecessário medo da escassez. O medo é um grande mal ou, melhor, pode ser a raiz de muitos males, pois ele faz com que nos afastemos da nossa verdadeira humanidade. Aos dois poemas!

JOGO DE ESPELHOS

Somos imagens em espelhos,
espelhos sem polidura,
imagens distorcidas,
reais.

À frente do espelho
vivemos,
distorcidos e assustados,
perdidos nas nossas contemplações,
tão distorcidas
quanto a imagem
refletida

À frente do espelho
vivemos,
fundidos a ele,
formando um só ser:
o espelho.

Zildo Gallo - Americana, SP, 16 de janeiro de 1975


VIDA-MEDO

De todos um pouco
nunca de ninguém
medo... medo...
tudo a medo
algo que se move
convulso dentro de cada ser
medo-vida
medo de não ter
de perder
nada
tudo.

Zildo Gallo - Ameircana, SP, 20 de agosto de 1975



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