domingo, 23 de abril de 2023

O Rei da Porrinha

Zildo Gallo

 

 

Zé do Palito, servente de pedreiro de profissão, no fim das tardes, depois de um dia de trabalho pesado na construção, para desanuviar a cabeça e para se esquecer do mestre de obras, que não cansava de encher-lhe o saco, jogava porrinha no boteco com palitos de fósforo partidos ao meio. A cada jogada, um trago de pinga, seguido de um trago num palheiro, e, assim, aos poucos, ele ia acalmando os nervos antes de pegar o rumo da casa.

Depois de muito jogar, Zé do Palito tornou-se o Rei da Porrinha, um jogo que exige velocidade de pensamento e muita intuição. Começando pelo Boteco do Seu Felício, sua fama percorreu toda a cidade, em cada boteco onde essa modalidade esportiva era praticada.

Assim a vida ia passando. Num certo dia, ele foi promovido no seu emprego e, com o novo salário, abandonou a caixa de fósforos e comprou um isqueiro dourado bem vistoso. Também abandonou o palheiro e começou a fumar Hollywood com filtro. Abandonou o Boteco do Seu Felício, substituiu a pinga pelo Conhaque Presidente e, para desanuviar a cabeça, acendia o seu isqueiro, ficava observando a sua chama e dava uma tragada profunda no seu Hollywood. Assim, acabou a sua carreira meteórica na porrinha. Dizem que, com o tempo, também se tornou amigo do mestre de obras.

Rei morto, rei posto. Um novo servente da obra, Zé do Feijão, assumiu o cargo vago e tornou-se o novo Rei da Porrinha, lá no Boteco do seu Felício. Todas as tardes, Zé do Feijão jogava porrinha, tomava seus goles de pinga, tragava seu palheiro e buscava, aos poucos, esquecer-se do seu chefe imediato, o Senhor José do Palito, que não media esforços para encher-lhe o saco.

 

quarta-feira, 19 de abril de 2023

OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO

Zildo Gallo



Os lírios nos meus delírios

Bailam doidamente,

Embalados pelos ventos campestres.

Apenas observo o bailado furioso

E, ensimesmado, me pergunto:

Esta fúria vem do vento

Ou do meu olhar inconformado

Diante de tanta beleza exterior,

Que não é nenhum reflexo de mim,

Que teimo em ser este bicho estranho,

Macambúzio e sorumbático?


terça-feira, 18 de abril de 2023

MANIFESTO ABELHEIRO

Zildo Gallo



Não se matam abelhas,

Abelhas de todo e qualquer tipo,

Em todo e em qualquer lugar.

Que elas vivam e sempre bem vivam,

Para que também vivamos,

Para que sempre bem vivamos

Uma vida sempre adocicada.

Bendito todo aquele que vive a defender

Cada abelha da Ignorância Capital,

Com suas penas capitais.

Apicultores de todo mundo,

Uni-vos!

Há que se endurecer!

Todavia, sem perder a doçura.

 

segunda-feira, 17 de abril de 2023

MACAÚBA

Zildo Gallo

 


Ei, imponente senhora macaúba!

Por que cresces tanto nas alturas?

Por que te cobres tanto de espinhos?

Como atingir a tua alta copa,

Sem lançar-te pedras incertas?

Assim, fico cada vez mais desejoso

E cada vez mais anseio

Pela doçura do teu fruto,

Pela crocância da tua castanha.

 

domingo, 16 de abril de 2023

CAMINHEIROS

Zildo Gallo


 


Os passos deixam rastros no caminho

Os caminhos estreitam-se e alargam-se

Conforme o andar dos caminheiros

O solo sulcado e ladeado de vegetação

Registra a contínua passagem

Daqueles que buscam alhures

Em paragens mais distantes

E mais seguras à existência

O descanso necessário à vida

Antes do descanso definitivo

Que se coloca além da linha

Do horizonte sempre buscado

 

segunda-feira, 10 de abril de 2023

POEMINHA

Zildo Gallo

 

 

Um poema curtinho

Que termina rapidinho

Então, pronto!


APÓLOGO

Zildo Gallo

 

 

O pires falou à xícara

Você tem a bunda quente

Ora, pires não falam

E xícaras não têm bundas

Todavia, é desse jeito

 

DA NOVELA

Zildo Gallo

 

 

Inicia-se em curto prólogo

Enredam-se fatos e fotos

Prós e contras

Tristezas e alegrias

Encontros e desencontros

Horrores e encantos

Capitulam-se crônicas e contos

Que entre si se enovelam

E rolam

E rolam

E rolam

Depois de tudo

O epílogo conclusivo

Paira uma tristeza no ar

E o mundo espera sentado

E, finalmente, FIM

 

TEMPO E ROUPA SUJA