segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE EM 2016!

Zildo Gallo
Para o próximo ano, desejo a todos os meus leitores e leitoras a concretização dos ideais interrompidos (no meu modo de ver) da Revolução Francesa (1789-1799), que conseguiu resumir em apenas três palavras (liberdade, igualdade e fraternidade) as condições necessárias à realização de uma vida digna e próspera para todos os cidadãos do planeta, não só para os cidadãos franceses.


A LIBERDADE é essencial ao desenvolvimento do potencial de cada indivíduo, todos os seres humanos precisam de LIBERDADE, indistintamente. Se tem algo que limita a LIBERDADE, este algo é a pobreza; ela dificulta o aprendizado (escola e cultura), a saúde (alimentação e cuidados sanitários) e a locomoção (o direito de ir e vir), que são essenciais ao bem-estar e à realização do espírito. No atual momento da humanidade, a pobreza extrema é muito grande e, ao mesmo tempo, a riqueza concentra-se de forma nunca dantes vista. O fosso entre ricos e pobres alargou-se no pós-guerra e continua nesta mesma dinâmica nos dias de hoje.
Para que a LIBERDADE alargue os seus horizontes, é preciso desconcentrar a renda e eliminar a pobreza. É necessário diminuir as diferenças sociais e aumentar a IGUALDADE. Quanto mais igual mais livre é a sociedade, pois a LIBERDADE é necessária a todos e não só para os que controlam as riquezas. Todos os seres humanos são iguais, independente da raça, da classe social, do gênero, da religião etc. Assim, a IGUALDADE pressupõe a inexistência de qualquer tipo de segregação e preconceito, pois eles contribuem para diminuir a LIBERDADE e impedem a FRATERNIDADE.
Por sua vez, a FRATERNIDADE é essencial à LIBERDADE e à IGUALDADE, já que ela se assenta na compaixão que cada ser humano precisa ter para viver em grupo, para realizar no seu processo de humanização, pois os homens só são (tornam-se) humanos em sociedade (o homem é um animal social - Aristóteles). A FRATERNIDADE é um instrumento essencial para a diminuição da pobreza e das diferenças sociais e ela precisa fazer-se presente na política, pois o homem também é um animal político (Aristóteles). Então, cabe ao Estado enquanto instância organizada e organizadora da sociedade buscar a diminuição da pobreza e a inclusão social. A sua função não é apenas garantir o "bom" funcionamento do mercado, como desejam os liberais conservadores, que olham para o mundo exclusivamente a partir das suas gordas posses pessoais.
A FRATERNIDADE, a IGUALDADE e a LIBERDADE são interdependentes e iguais em valor. Não dá para pensá-las isoladamente e nem de forma particular, a partir do indivíduo, ainda que a individualidade (não confundir com individualismo) seja um valor que deve ser preservado/respeitado (a individualidade não é um valor absoluto para o cidadão, pois, quando extremada, ela pode ferir a individualidade alheia, aí ela vira individualismo), pois elas são valores coletivos, humanizantes, necessários à convivência pacífica e próspera da humanidade como um todo. Hoje, a humanidade passa por um momento de extremo individualismo, egoísmo mesmo, e os resultados disso estão à vista (pobreza, violência, drogas, poluição, guerras, preconceitos, intolerâncias etc. etc. etc.) de todos que queiram verdadeiramente ver. A individualidade tem seu limite e ele se localiza nas fronteiras do bem-estar coletivo.
liberté * egalité * fraternité - já!!!!!!!


DEPOIS DE TANTOS ANOS, A HUMANIDADE JÁ ESTARIA (DEVERIA ESTAR) MADURA E CONSCIENTE O SUFICIENTE PARA REALIZAR (COMPLETAR) ESTA REVOLUÇÃO DE FORMA TOTALMENTE PACÍFICA, SEM A VIOLÊNCIA DE 1789, COMO ACONTECEU NA FRANÇA REVOLUCIONÁRIA. SERÁ QUE ESTÁ? ATÉ QUANDO A HUMANIDADE VAI PRESENCIAR TANTA TRAGÉDIA SEM SE MOVER? ELA AINDA NÃO SE CANSOU? PARECE QUE NÃO... TORÇAMOS PARA ISSO...
FELIZ ANO NOVO!


sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

O necessário retorno à natureza: nova cultura e nova economia

Zildo Gallo

Uma volta à natureza é mais que necessária no atual estágio do desenvolvimento do capitalismo. Pelo menos quatro aspectos ambientais negativos da moderna sociedade industrial indicam a necessidade urgente de uma reconexão com o ambiente natural: aquecimento global (efeito estufa); diminuição da disponibilidade de água doce apta ao consumo humano e à dessedentação de animais; excesso de descarte de resíduos dos mais variados tipos no meio ambiente e; superexploração dos recursos naturais. São apenas quatro aspectos, mas são, sem nenhum exagero, devastadores. O aquecimento global, por sua amplitude de caráter planetário, representa o maior risco. Ele tem a ver com a queima de combustíveis fósseis, que alimentam energeticamente a moderna sociedade industrial. A figura abaixo, que resume a situação vivida pela humanidade na relação economia-ecologia, deve ser observada com atenção e cuidado.

Fonte: Prof. Dr. Zildo Gallo

Olhando para o lado direito da figura, vê-se uma representação da relação economia-ecologia antes das revoluções industriais, numa sociedade pré-industrial. Podia-se afirmar com segurança que a economia estava mais subordinada ao meio ambiente, principalmente pelos limites impostos aos homens pela matriz energética de então, que dificultava a movimentação autônoma de máquinas e limitava a velocidade e a capacidade do sistema de transportes. A produção de mercadorias era muito pequena se comparada com a situação da sociedade industrial e, por consequência, a destruição da natureza também acontecia numa escala muito menor. Tudo isso já é sabido, então, não é necessário alongar-se no assunto.

Então, o que é importante e de interesse aqui neste artigo. O que interessa é a discussão de como sair da situação (pós sociedade industrial) descrita no lado esquerdo da figura, onde a natureza vive uma situação de total subordinação à economia e onde a sua exploração já tem ultrapassado os limites indispensáveis à sua autorregeneração. A figura acima sugere uma espécie de retorno à situação pré sociedade industrial sem perder os avanços científicos e tecnológicos conquistados até aqui; trata-se de um retorno à natureza num estágio superior da civilização.

Em relação à indústria o que se pede é que ela diminua o uso abusivo dos recursos naturais (minerais, energéticos, florestais etc.) e que diminua as externalidades negativas, com destaque para a poluição, o que implica na redução dos resíduos produzidos e no aumento da vida útil das suas mercadorias (fim da obsolescência programada). Ela deve também se responsabilizar pela reciclagem dos seus produtos (bens de consumo duráveis e semiduráveis e embalagens) e diminuir expressivamente a produção de bens nãos recicláveis, como as embalagens não passíveis de reciclagem, por exemplo. E o mais importante: ela precisa diminuir a emissão dos gases do efeito estufa numa velocidade maior do que a de agora. Tudo isso implica em muita ciência e não na sua negação, como muitos pensam, pois é necessário migrar de uma tecnologia de alto impacto para outra de baixo impacto.

Em relação à agropecuária, o que se espera é que ela supere a "revolução verde", baseada em insumos artificiais (agrotóxicos e fertilizantes químicos) e evolua no sentido da agroecologia, onde a agropecuária interage com o meio ambiente de forma positiva, onde a natureza torna-se uma aliada do produtor rural, deixando de ser uma inimiga que precisa ser combatida com "defensivos agrícolas". Também se faz necessária um diminuição do consumo de carne, em particular a bovina, que contribui para o aumento do efeito estufa pela emissão de metano e pela diminuição das florestas que se convertem em áreas de pastagens (expansão da fronteira agrícola). Assim, a agroecologia implica em muita ciência, pois se faz necessário um profundo conhecimento do meio natural para se praticar uma agricultura que conviva de forma harmoniosa e produtiva com ele. Para a agropecuária vale o mesmo que para a indústria: é necessário migrar de uma tecnologia de alto impacto para outra de baixo impacto.

Hoje a maior parte da população mora nas cidades e elas se tornaram insustentáveis do ponto de vista socioambiental. Há que se pensar numa cidade para a coletividade e não para o indivíduo. Um dos grandes dramas dos grandes centros urbanos está na mobilidade. É necessário migrar de um modelo baseado no transporte individual para outro sustentado no transporte coletivo; isso implicaria no fim dos eternos congestionamentos e na diminuição significativa da poluição do ar. As cidades também precisam de mais áreas verdes, livres de construções, para o lazer e para o necessário contato com a natureza, há muito tempo inexistente ou muito restrito nos meios urbanos. Muitos habitantes das cidades vivem em condições de pobreza e acabam ocupando áreas ambientalmente muito frágeis, como as margens dos corpos d'água e as encostas de morros. As soluções habitacionais devem levar em consideração o bem-estar das pessoas e a qualidade ambiental. Há que se ir além da especulação imobiliária desenfreada e evoluir para uma situação de planejamento urbano que considere tanto as questões sociais como as ambientais, entendendo que morar bem é um direito de todos, indistintamente, tratando-se de um direito humano fundamental. Para o planejamento urbano também é válido o mesmo que para a indústria e a agricultura: é necessário migrar de uma tecnologia de alto impacto para outra de baixo impacto.

O Brasil adotou, particularmente a partir da ditadura militar, a opção rodoviária para o transporte de pessoas e cargas. Isso tem implicado no consumo exagerado de petróleo e no aumento da poluição, principalmente em relação à emissão de gases do efeito estufa. As ferrovias, as hidrovias e a navegação de cabotagem são saídas mais sustentáveis do ponto de vista ambiental. A mudança da matriz de transportes além de uma necessidade econômica (implica em sensíveis barateamentos de custos, o chamado "custo Brasil") também significa impactar menos o meio ambiente, já que diminuiria a quantidade de caminhões transitando pelas rodovias e a de automóveis congestionando as autoestradas e as ruas das cidades, principalmente das metrópoles. Trata-se de um processo de médio e longo prazos, mas que precisa ter seu início já, imediatamente.

Outra mudança fundamental é a dos padrões de consumo. Muitos consomem em demasia e outros muitos passam necessidades. Os que consomem em excesso precisam consumir menos, em alguns casos muito menos, e os que pouco consomem (os pobres) precisam consumir mais. Para ambos serve a seguinte orientação: é preciso consumir moderadamente e com qualidade, pois os bens de consumo devem ser benéficos à saúde e não devem impactar o meio ambiente; no caso dos bens duráveis, eles precisam ser efetivamente duráveis, evitando o seu descarte precoce. É necessário ir além da cultura do descartável, que cresceu por conta da comodidade e dos interesses do capital. Os consumidores precisam conhecer os impactos produzidos pelo seu consumo. Trata-se da necessidade de uma revolução cultural, que implicaria numa mudança de valores que vai no sentido de migrar da valorização das aparências ostentatórias para a valorização de elementos apenas aparentemente mais subjetivos como cultura, conhecimento, qualidade de vida, bem-estar físico e mental etc.

A título de contribuição ao debate, abaixo estão lançadas várias propostas que objetivam melhorar as condições socioambientais do nosso planeta. Estou no Ocidente e como ocidental tenho como sugerir contribuições para o necessário retorno à natureza através das mudanças culturais e socioeconômicas. A partir do meu livro "Ethos, a Grande Morada Humana: Economia Ecologia e Ética" (2007), eu escrevi neste blog um artigo denominado "Como começar a mudar o mundo a partir do ocidente". Nele eu tomei como ponto de partida as questões inerentes ao Ocidente e elaborei um conjunto de propostas que considero necessárias para que se comece uma trajetória positiva no sentido da construção de um mundo melhor. Seria uma espécie de "como podemos fazer a nossa parte". Não são propostas facilmente exequíveis, por conta do primitivo estágio civilizatório da humanidade ainda nos tempos atuais, mas são necessárias à própria sobrevivência da humanidade de forma digna. Não considerá-las neste momento, pode significar um passo rumo à barbárie. Transcrevo aqui as propostas do meu artigo:


Sobre a academia e a fragmentação da ciência - Em relação à fragmentação do conhecimento científico, tem-se observado uma mudança positiva, nos últimos anos, que já tem chegado ao meio acadêmico. A academia já tem, pelo menos parte dela, enfrentado a resistência ao conhecimento interdisciplinar. Trata-se de um exercício de humildade que o cientista precisa adotar, saindo do casulo da sua área de saber e se aproximando das demais. Contudo, há muito que avançar ainda; o ocidente ainda continua muito impermeável à penetração de saberes de outra origem; os conhecimentos provindos do oriente servem para exemplificar. Mas, até em relação a estes, as resistências têm  diminuído, apesar da lentidão. A aceitação das medicinas chinesa e indiana são bons exemplos disso, por exemplo.

Sobre a ética planetária - A necessidade de se construir uma ética para o planeta Terra é de extrema impor­tância e sua relevância para a própria sobrevivência da humanidade é, cada vez mais, in­questionável. Os limites do estado-nação precisam ser superados. Doravante, é necessário modelar um novo projeto de civiliza­ção, baseado na paz e no cui­dado para todos os países. É preciso fundar um novo ethos para permitir uma nova convivência entre os ho­mens e destes com todos os demais seres do planeta. A nova ética deverá nascer da essência, da natureza mais profunda do ser humano. Ocorre que a essência do homem está muito mais no cuidado, na com­paixão, do que na razão e na vontade. Há que se resgatar a essência do humano. É preciso ir além da ciência, muito além. Trata-se de um projeto de caráter multicultural, envolvendo todas as tradições culturais de todos os povos, incluindo aí todas as religiões, indistintamente. Há a necessidade de aberturas de diálogos entre as culturas e religiões diferentes no sentido de se estabelecer um espaço de paz e tolerância entre elas.

Sobre a ética econômica - A aproximação entre ética e economia é cada vez mais necessária e será be­néfica para ambas. Muitos problemas éticos estão ligados a questões logísticas, que são objetos de estudo da ciência econômica, como o problema da fome, do saneamento básico e da exploração do trabalho infantil, entre vários outros. As soluções passam, muitas vezes, pela engenharia econômica, a engenharia econômica a ser­viço de um objetivo maior, ético: o bem-estar social. A responsabilidade pelo bem-estar social é de todos, não é só dos eco­nomistas, ela é nacional e transnacio­nal, porque os seres humanos que sofrem não podem ficar segregados nos seus territórios. É preciso encarar toda a humanidade como uma grande família. Onde quer que habitem, a preocupação com os que têm fome e padecem de doenças não pode cessar porque os aflitos estão do outro lado da fronteira. A ética econômica precisa ter este caráter universal.

Sobre uma filosofia para a natureza - O desenvolvimento da razão científica, que é o principal pro­duto da civilização ocidental, distanciou o homem da natureza e facilitou para que ele assumisse uma atitude arrogante e dominadora em relação a ela. Acontece que a racionalidade do ocidente é linear e fragmentada (cada ciência no seu quadrado), uma herança da Revolução Científica que teve início no século XVII, e os sistemas ecológicos são redes dinâmicas não lineares. Esta racionalidade não consegue captar a complexidade dos sis­temas vivos e o resultado disto pode ser visto nas tragédias ambientais que se espalham por todo o planeta. Quando se ana­lisa a modernidade científica e técnica, descobre-se por detrás dela o funciona­mento de uma determinada filosofia: o “realismo materialista”. A nova filosofia precisa ser uma alternativa ao realismo materialista; deve ser holística, ecológica e espiritual. Ela também precisa extrapolar o antropocentrismo, pois toda a natureza e os seus ecos­sistemas devem ser considerados. A ciência econômica, por exemplo, não pode cuidar só do bem-estar dos seres humanos, mas de todos os seres, indistintamente, que precisam de água com quali­dade adequada, de solos não contaminados, de ar limpo e alimentação.

Sobre a sustentabilidade do desenvolvimento -  O desenvolvimento sustentável deve ser aquele que, além de atender às ne­cessi­dades do presente, também não compromete a possibilidade de as gerações futuras aten­derem as suas próprias necessidades. A humanidade precisa rapida­mente ser capaz de tornar sustentável o desenvolvimento econômico. O conceito de desenvolvimento sustentá­vel tem limites; não são limites absolutos, são limites impostos pelo estágio atual da ciên­cia, da tecnologia e da organização social e pela capacidade da biosfera de absorver os efeitos antrópicos negativos. Tanto a tecno­logia quanto a organização social devem ser geridas e aprimoradas a fim de pro­porcionar uma nova era de crescimento econômico que não produza de novo as destruições que o progresso material tem provocado até agora. O desen­volvimento sustentável não é um estado de harmonia permanente. Trata-se de um processo de mudança bem difícil, mas necessário, onde o uso dos recursos, a alocação dos investi­mentos produtivos, o desenvolvimento da tecnologia e as mudanças institucionais têm que estar em conformidade com as necessidades do presente e do futuro. Do ponto de vista econômico, há que se pensar no longo prazo, o que significa uma mudança radical, pois o mercado atua quase que exclusivamente no curto prazo. Assim, é necessária a reintrodução do planejamento no debate econômico, algo que foi deixado de lado com a expansão do neoliberalismo a partir dos anos 80 do século XX, indo além do mercado.


A retomada do crescimento econômico em termos planetários é necessária e o mercado sozinho não tem meios para tanto. Então, há que se pensar num novo New Deal (Novo Acordo), mas desta vez ele tem que avançar em relação ao planejamento adotado por Franklin Roosevelt para os Estados Unidos, entre 1933 e 1937, que estava focado em dois aspectos, o crescimento econômico e o progresso social, introduzindo a gestão ambiental como um terceiro aspecto indispensável. Trata-se da necessidade de se adotar uma espécie de Green New Deal (Novo Acordo Verde), que leve em consideração a capacidade de suporte da natureza e ao mesmo tempo realize o bem-estar social, incluindo as populações excluídas das benesses da modernidade.

Fonte: Prof. Dr. Zildo Gallo

Sobre o consumismo - Nos dias de hoje, o consumidor com poder de compra, com renda, fica ator­doado diante do imenso leque de possibilidades de consumo posto à sua frente e não consegue compreender as suas repercussões sobre o meio ambiente do planeta. Assim, as propos­tas de mudança nos padrões de consumo são importantes na busca da utopia de uma “sociedade sustentável”. Os consumidores podem e devem politi­zar as práticas de con­sumo, cobrando dos produtores práticas sociais e am­bientais responsáveis. Então, há que se fazer um esforço para diminuir a ignorância do consumidor sobre as repercussões das suas escolhas, ou seja, torná-lo ciente do impacto delas. É necessária e urgente uma “alfabetização ecológica”. Ela ajudaria o consu­midor a compreender as consequências das escolhas. Ensinar o “saber ecológico” será o maior papel da educação neste século. A alfabetização ecológica precisa se tornar uma obrigação para políticos, empresários e profissionais de todas as áreas, e deve ser, também, uma preocupação central da educação em todos os seus níveis – fundamental, médio, universitário e profissionalizante.

Sobre uma democracia global - A necessidade de se construir uma democracia global é óbvia tanto para os diri­gentes dos países maiores quanto para os dirigentes de países pequenos. Ocorre que, num mundo globalizado, as ações de cada país podem repercutir em todo o planeta até por séculos adiante e a democracia, nos moldes atuais, continua ele­gendo seus dirigentes com base em eleições nacionais para mandatos de durações curtas. O mundo tornou-se global e de longo prazo e a democracia ainda é nacional e de curto prazo. Neste sentido, para se democratizar, a globalização deve deixar de ser identificada apenas com o comércio, como acontece nos dias de hoje. As relações de comércio continuarão moldando o futuro próximo do planeta Terra por um longo tempo. Entretanto, para que elas aconteçam dentro dos marcos civilizatórios, terão que ser acompanhadas por uma crescente solidariedade internacional, que contemple investimentos para superar a exclusão social e as catástrofes locais. Uma democracia global tem que combinar a demo­cracia nacional com a solidariedade internacional e histórica em relação às socie­dades de hoje e às gerações futuras.

Os pontos levantados acima caracterizam uma Nova Utopia. Cada vez mais há que se pensar em termos globais, este é o princípio número um. Todavia, a globalização pretendida deve ir muito além da mera globalização econômica dos dias atuais. É necessário que se universalizem valores humanos lastreados em princípios igualitários e de justiça: fim da pobreza; das exclusões por credos religiosos, raça, opção sexual etc. e; fim das desigualdades entre homens e mulheres. Muitos direitos também devem ser globalizados: segurança alimentar; educação; saúde; habitação; transporte coletivo etc. Enfim, há a necessidade de se pensar uma sociedade nova, sem privilégios de nenhuma ordem. O estado de bem-estar social (Welfare State), existente em vários países da Europa, com destaque para os países nórdicos, precisa ser universalizado como ponto de partida para uma nova sociedade. As palavras de ordem da Revolução Francesa (Liberté, Egalité, Fraternité) precisam ser postas de novo na ordem do dia, pois, afinal, somos todos iguais, ou não somos? A liberdade deve ser para todos e se tem algo que limita a liberdade, este algo é a pobreza. A fraternidade, por sua vez, é um valor que precisa ser universalizado, que precisa adentrar nos corações e mentes de todos os seres humanos, pois ela é o ponto de partida para a igualdade. Não dá para pensá-las separadamente, como costumeiramente acontece.
Referência

GALLO, Zildo. Ethos, a grande morada humana: economia, ecologia e ética. Itu, SP: Ottoni Editora, 2007.
GALLO, Zildo. Como mudar o mundo a partir do Ocidente. Disponível em: http://zildo-gallo.blogspot.com.br/2015_03_01_archive.html











terça-feira, 8 de dezembro de 2015

A mamadeira de manga e o coquinho da macaúba

Zildo Gallo
Não sei exatamente quando, pois era muito pequeno, só sei que aprendi isso quando morava no meio rural no município de Borborema (SP). A meu ver, trata-se de um aprendizado extremamente útil, algo que se aprende quando se mora no sítio: como chupar manga sem se lambuzar, aproveitando o máximo da fruta, sem o auxílio de facas e garfos. A cidade passa ao largo de tais conhecimentos, pois, principalmente nos dias de hoje, encontra-se muito distante da natureza e dos seus ciclos naturais, incluindo aí o conhecimento sobre a época de cada fruta. No caso da manga espada, que considero a mais saborosa, mas que tem o inconveniente do excesso de fiapos, considero que o método é o mais adequado.


O método é bem simples, simples mesmo, denominei-o "mamadeira de manga", é assim: 1) pegue uma manga bem madura, quanto mais madura melhor; 2) amasse-a com relativa delicadeza para que a casca não se rompa; 3) faça um furo na extremidade posterior, o suficiente para que o caldo saia; 4) chupe o caldo pelo orifício; 5) continue amassando, delicadamente, e chupando enquanto notar que ainda existe polpa chupável. Funciona e, quando terminar, o caroço pode ser dispensado com a casca. Todavia, quando criança, mesmo quando adotava o método, não dispensava o caroço e aí lambuzava-me todo. Não tenho na memória lembranças de não chupar o caroço. Chupar o caroço da manga é pura diversão, ou não?
Outra fruta que me atraía muito no sítio era a macaúba. Trata-se de um coco que possui uma saborosa polpa amarela, com uma castanha mais saborosa ainda. A macaúba é uma palmeira do cerrado, muito comum nos pastos e nas matas do interior do Estado de São Paulo. Trata-se de uma planta bonita e altamente produtiva, cuja castanha, além de deliciosa, por conta do alto teor de gordura, pode transformar-se em biodiesel.


Quando menino, eu era um viciado em coquinhos de macaúba. Vivia pelos pastos a cata de cocos e sempre encontrava muitos, praticamente todos os dias. Extrair as castanhas era muito simples, bastava um martelo e uma superfície dura para quebrar os coquinhos, só isso... Na minha infância, a última vez que comi macaúba no sítio foi inesquecível porque também foi uma experiência muito dolorida. Olha a macaúba aí, gente!


Às vésperas de mudar-me do meio rural borboremense, eu estava quebrando macaúbas no quintal em cima de uma pedra, que estava colocada próxima do meus pés. Estava agachado, solitário, quebrando cocos e devorando-os em seguida, uma atrás do outro. Num dado momento, errei a martelada e acertei o meu dedão do pé esquerdo. Ainda hoje tenho a memória da dor. Mudei-me para Americana (SP) alguns dias depois. A unha enegrecida foi cair na minha nova cidade. Na minha infância, voltei apenas duas vezes a Borborema e, é claro, comi macaúbas. Depois disso, só depois dos meus trinta anos de idade, saboreei novamente as castanhas memoráveis. Da vida no campo, que ficou muito distante no tempo, guardo recordações muito agradáveis. Entre elas, as relativas às suculentas mangas espada chupadas na forma de mamadeiras e às dos coquinhos da macaúba, extraídos a marteladas, um a um, ocupam lugares especiais nas prateleiras da minha memória.


NOTA DA REDAÇÃO

  Zildo Gallo     Da floresta sempre chegam notícias De homens matando homens Estranhamente... Não chegam notícias De onças ma...