Zildo Gallo
Nos
idos de 1875, um apaixonado pela ainda relativamente recente arte da fotografia discursava e
se deixava fotografar na pequena Vila Americana, um lugarejo que pertencia ao pequeno município de Santa Bárbara, na Província
de São Paulo. Era Dom Pedro II, o Imperador do Brasil. Alguns dos
ouvintes talvez nem entendiam as suas palavras, mas, com toda certeza, sabiam
da sua importância. Eram homens e mulheres habituados à língua inglesa, chegados
a pouco no Brasil, moradores da Vila, com seus troles, carroças e roupas de feriado,
acompanhando a inauguração da estação ferroviária de Santa Bárbara D'Oeste, que
foi edificada às margens do rio Quilombo, à época um córrego de águas límpidas,
abundantes e repleto de peixes. Foi uma efeméride marcante, que contou com a
presença da então autoridade máxima do Brasil de então: Dom Pedro II, o Imperador.
A
inauguração da estação ferroviária da Companhia Paulista de Estrada de Ferro
trazia esperanças e possibilidades de bons negócios a essas pessoas que viviam
do trabalho na terra. O plantio do algodão, já há alguns anos, não garantia os
melhores resultados financeiros aos colonos americanos, refugiados sulistas,
outrora confederados, que começaram a se instalar na região nos últimos anos
da década de sessenta do século XIX. A ferrovia serviria como escoadouro veloz
– a rapidez era necessária – de um novo produto, um produto perecível, uma
variedade de melancia ainda desconhecida no Brasil, a “cascavel da Geórgia”.
A
agricultura canavieira para a fabricação de aguardente, que também era uma
atividade econômica muito lucrativa naquela época, foi uma alternativa
abandonada por várias famílias americanas, já que não era condizente com os
seus valores protestantes. Outros imigrantes americanos, por seu turno,
imbuídos de um pragmatismo mercantil, também característico às populações
praticantes das religiões oriundas da reforma protestante, desconsideraram as
restrições religiosas, construíram seus engenhos e também foram bem sucedidos,
ainda que sem as necessárias e reconfortantes bênçãos do Senhor. Não importa a
nacionalidade e nem os valores religiosos, os seres humanos costumam ser
incoerentes e "negócio é negócio". Com o trem, muitas vezes mais
veloz que as velhas carroças, a "cascavel
da Geórgia" tornar-se-ia uma boa alternativa de negócio.
O
imigrante norte-americano tinha bons motivos para comparecer à inauguração da
estação, pois Dom Pedro II foi um grande incentivador da sua vinda ao Brasil,
tratava-se um tipo de retribuição. Além disso, pouco tempo depois da sua
chegada, ele recebeu de presente uma estação de trens bem na porta da sua casa.
Um baita presente para ajudar no esquecimento das agruras da Guerra de
Secessão. Em retribuição ao acolhimento da nova pátria, os americanos sulistas
introduziram as sementes dessa deliciosa melancia, que se esparramou por todo o
território nacional.
Apesar
do seu nome assustador, a cascavel enquanto melancia, trata-se de um saboroso
presente, sem dúvida alguma. Muitos anos depois, no período republicano, no
século XX, os descendentes dos norte-americanos presentearam os brasileiros com
outro excelente presente: Rita Lee, a nossa Rainha do Rock. As coincidências da
vida: o rock surgiu nos EUA e a nossa maior roqueira descende dos americanos
sulistas; não acredito em coincidências, mas, seguindo as pegadas do Doutor Carl
Gustav Jüng, acredito em sincronicidades; este é um bom exemplo de sincronicidade,
ao meu ver.
Contei esta pequena
história, recheada de alguma fantasia, para simplesmente homenagear os
moradores (imigrantes do sul dos EUA) que deram o nome à cidade onde vivi, da
minha infância até os meus trinta anos de idade, e também para agradecer-lhes
pela melancia, que muito aprecio, e por Rita Lee, a quem aprendi a admirar
desde o início da sua brilhante carreira.
Linda esse jeito de contar histórias. Um pedacinho da nossa cidade. Abçs Zildo.
ResponderExcluirSempre bom colocar no papel a historia da nossa cidade para que se registre o acontecido.
ResponderExcluirComo é bom recordar a nossa história............Os americanos foram importantes para o desenvolvimento da região assim como os italianos dos quais sou descendente.
ResponderExcluirNão podemos esquecer da história de Carioba dos Müllers
ResponderExcluirCarioca também tem muita história para ser contada. A história começa antes dos Muller e se estende até o início da década de 80 do século passado.
ExcluirTexto elegante, Zildo, recheado de detalhes que permitem ao leitor fazer uma viagem no tempo. Particularmente, eu te agradeço pela oportunidade fazer este passeio, em parte da história da cidade onde eu cresci. (Celinha Piglione)
ResponderExcluirexcelente seu texto
ResponderExcluirExcelente texto
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