Zildo Gallo
A
profusão de plantas da Mata Atlântica brasileira favorece a sobrevivência de
uma grande variedade de animais; a variedade produz variedade. As florestas das
regiões frias, caracterizadas pela presença de poucas espécies, destacando as
coníferas, como os pinheiros, não propiciam a mesma variedade de vida animal
que a das nossas matas. As nossas matas do Cerrado também têm mais variedade
que as das regiões frias, apesar de apresentarem menor diversidade que a Mata
Atlântica. Esta discussão quantitativa é muito complicada, pois cada bioma tem
a sua riqueza e a sua importância ambiental dentro do nosso planeta.
Contudo,
podemos ver no Brasil muitas florestas homogêneas. São as florestas plantadas
para o fornecimento de matérias primas para a indústria de transformação, como
as de eucaliptos, para a produção de celulose e papel, e as de pinheiros, para
a produção de móveis. No Estado de São Paulo também existem florestas plantadas
de seringueiras, que fornecem matéria-prima para a indústria de artefatos de
borracha. Nessas florestas a diversidade de vida animal é ínfima, quando
comparadas com as florestas nativas: Mata Atlântica e Cerrado.
Andar
no meio da Mata Atlântica, não é tarefa fácil para os habitantes do meio
urbano, pois o emaranhado de árvores, arbustos e cipós dificulta sobremaneira a
caminhada e é muito fácil perder-se no meio dela. Por sua vez, andar numa
plantação de eucaliptos é muito fácil: as árvores são militarmente enfileiradas
e debaixo delas não nascem espécies vegetais que compitam com elas; geralmente
entre as fileiras os corredores permanecem livres o suficiente para se caminhar
sem atropelos. Então, é só caminhar em
linha reta que se atravessa para o outro lado.
Qual
floresta tem maior valor? a da Mata Atlântica? a de eucaliptos? Depende de que
tipo de valor estamos falando. Se for do ponto de vista do mercado, a de
eucaliptos é a mais valiosa. Se for do ponto de vista da biologia, a Mata
Atlântica é a mais valiosa. As florestas naturais têm grande variedade de
espécies vegetais e elas sustentam uma grande variedade de espécies animais (a
variedade produz variedade). As plantadas têm uma única espécie e, assim,
sustentam uma pequena variedade de espécies animais; todavia elas oferecem um
retorno financeiro imediato que as florestas naturais não fornecem. As
florestas plantadas são importantes do ponto de vista econômico e as naturais
são importantes do ponto de vista do equilíbrio ecossistêmico.
O
que estou querendo dizer? Estou mostrando que mercado e meio ambiente são
conflitantes. A riqueza da variedade conflita com a riqueza financeira da
monocultura. No Brasil, durante os anos da ditadura militar, prevaleceu a
concepção utilitarista da economia mercantil em detrimento da ideia de
equilíbrio ecossistêmico. Hoje, pelo menos, é possível manifestar-se contra a
visão economicista da natureza. Também hoje ficou claro que as questões
ambientais precisam estar regulamentadas, muito bem regulamentas, e que só isso
não basta, pois há uma necessidade de monitoramento constante em defesa da
preservação da qualidade ambiental.
Relembrando
a história: pela Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, foi instituído um novo
Código Florestal. Uma boa parte da legislação dizia respeito ao controle do
corte indiscriminado das áreas florestais do país. Pelo Código, as florestas
existentes no território nacional passaram a ser reconhecidas como de interesse
comum a todos os habitantes do país. Havia uma preocupação com o
reflorestamento, mas com a falta de uma descrição sobre quais espécies poderiam
ser utilizadas, o Código Florestal de 1965 deu abertura a uma série de
irregularidades no processo de liberação de créditos para o replantio de
árvores.
Como
não foi estipulado que o replantio deveria ser feito com espécies nativas, o reflorestamento
passou a ser feito com espécies exóticas e também com árvores frutíferas. As
espécies exóticas como o Pinus ssp e
o Eucalyptus foram preferidas por sua
maturidade precoce quando comparadas com as espécies nativas. Apoiados na legislação, muitos produtores agrícolas conseguiram financiamentos e reflorestaram
nos moldes da monocultura e obtiveram ganhos financeiros com isso. Por sua vez,
a natureza perdeu em termos de biodiversidade. Prevaleceu a ideia da riqueza
financeira, propiciada pelo monocultivo, em detrimento da riqueza como
variedade natural. Assim é o mercado: imediatista e reducionista.
No
ano de 1965, o Brasil estava no seu segundo ano da ditadura militar. Será que o
esquecimento sobre as espécies arbóreas a serem utilizadas no reflorestamento
foi algo meramente acidental? Tenho a impressão que acreditar nisso é uma
ingenuidade, ou não? Os ignorantes sobre a história do Brasil, que estão
pedindo a volta da ditadura militar, talvez acreditem na ingenuidade dos
governos militares: "eles erraram, mas eram bem intencionados",
diriam eles, desculpando-os. Para esses vale o dito popular: "de boa
intenção o inferno está cheio".
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